15 dezembro 2012

UM BRANCO MAU

O Papa Pio XII transportado num trono pela cidade de Roma - 1940

Uns amigos de Portugal enviaram-me por mail uma fotografia (ver na página seguinte) acompanhada apenas por esta legenda: Britânico transportado por umas coisas chamadas gente. Eu, maldisposto por causa do frio, vento, chuva e a escuridão que por cá às quatro da tarde já se faz sentir, resolvi fazer umas perguntas que normalmente não faria, mas neste estado de espírito  parecem-me pertinentes. Mas por favor, não me levem a mal, não sou eu, é o clima:






Quantos portugueses nas nossas ex-colónias se fizeram transportar da mesma maneira? Quantos Papas, apesar das lições de humildade do Cristo, se fizeram transportar precisamente da mesma maneira? E quantos dos que transportavam passaram mais tarde, quando a fortuna lhes sorriu, a ser transportados?



Quantos por esse mundo fora ainda HOJE se fazem transportar da mesma maneira, sem que os bem-pensantes se incomodem? É certo e sabido, quando não há brancos à baila o nosso relativismo cultural começa imediatamente a funcionar a toda a brida para desculpar a coisa com truques cognitivos:

é a religião desta gente! é a cultura desta gente!

Mas pode acontecer, quando estamos perto do Natal ou quando encontramos uma velha fotografia de um branco em trajos menores - e sobretudo se o branco não pertence à nossa família esquecemos facilmente que faz parte dos que nos facilitaram a vida com a invenção do comboio, da electricidade, do telefone e da máquina de lavar - gritamos:

Ó DA GUARDA, vejam como o branco é mau, como trata(va) os menos brancos do que ele abaixo de cão



12 comentários:

  1. "I am strongly in favour of using poisoned gas against uncivilised tribes (…) to spread a lively terror"
    - Winston Churchill sobre o modo de dominar a rebelião curdo-iraquiana, no Verão de 1920.
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    "We are not a young people with innocent record and a scanty inheritance. We have engrossed to ourselves — an altogether disproportionate share of wealth and traffic of the world. We have got all we want in territory, and our claim to be left in the unmolested enjoyment of vast and splendid possessions, mainly acquired by violence, largely maintained by force, often seem less reasonable to others than to us"
    – Winston Churchill
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    “I do not admit, for instance, that a great wrong has been done to the red indians of America or the black people of Australia. I do not admit that a wrong has been done to these people, by the fact that a stronger race, a [higher great (1)] race, a more wordly wise race, to put it that way, has come in and taken that place”.
    - Winston Churchill
    (1) Não tenho certeza das palavras (audio)
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    As citações que reproduzi traduzem a consciência que os líderes europeus sempre tiveram das acções que praticaram pelo mundo fora, ao longo dos últimos séculos.

    Fotografias como a que enviei não aparecem com frequência nos media; é preciso procurar, à medida que vão sendo desclassificadas.
    Enviei-a para contrariar a persistente amnésia europeia sobre o colonialismo e imperialismo (passe o sarcasmo e a mordacidade do título).

    Porque o resto do mundo não esquece. Ainda hoje tem a resolver inúmeros conflitos resultantes do legado europeu e sabe que os nossos líderes continuam a ter a mesma postura de dominação:

    "O desafio básico é que a chamada globalização é realmente um outro nome para o papel dominante dos Estados Unidos"
    - Henry Kissinger - Palestra no Trinity College, Dublin, 12/Out/1999
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    Quanto ao frio... tenho a impressão que foi uma das razões que me fez deixar a Holanda.

    Abraço para todos.



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  2. Qual o interesse em sublinhar apenas UM povo, o inglês, sabendo que todos os outros fizeram (há quem ainda faça) o mesmo ou pior?

    Este tipo de fotografias não aparecem com frequência porque deixaram de ter actualidade, mas podem ser vistas livremente e a qualquer momento em museus e arquivos europeus. Até podem ser sacadas gratuitamente através da Internet (invenção que os maus dos ocidentais puseram à nossa disposição).

    Além disso, as bibliotecas europeias - refiro-me à Europa democrática - estão cheias de livros onde os crimes do colonialismo e outros estão bastante bem documentados! Na televisão europeia são transmitidos frequentemente documentários sobre esta temática!

    Onde está a persistente amnésia?

    “o papel dominante dos Estados Unidos”

    Neste mundo houve sempre alguém com um papel dominante. É inevitável e sempre foi assim, porque Deus, se existe, não se exprime ou não se quer meter no assunto. A única coisa que podemos fazer é exprimir a nossa preferência: aceitar o papel dominante dos EUA, ou preferir a dominância chinesa...

    “[o frio]… uma das razões que me fez deixar a Holanda.”

    Mas também deixar a Holanda para voltar para Gaia, onde no Inverno há frio por todo o lado: é na rua, é em casa, é no café, é no restaurante, é nas bancadas do Vilanovense – uma desgraça pegada. Para quem não é agricultor, a região do Porto só é habitável e sobretudo visitável entre Maio e Setembro.

    Aaaaaaaaaaaaaaa Txxxxiiiiiiiiiiinnnnnnnnnnn.

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  3. Sem querer simplificar demasiado este assunto. Um par de achegas.

    A crença comum, que uma imagem vale mil palavras, está talvez na origem deste post e na minha opinião, na origem de uma grande confusão sobre o valor das imagens e da onda de demagogia visual, a que nos submete a msm.
    É esta convicção que leva diariamente, os redactores de imagem dos telejornais a fazer horas extraordinárias, para montar pseudo documentários, recorrendo à carga emocional subjectiva das imagens, para suportar (ilustrar) teses politicas e abstracções ideológicas só compreensíveis por palavras.

    No caso destas 2 imagens, não é complicado reduzir a relação de espaço e forma que documentam as fotografias, para relações de poder do imaginário pessoal.
    O gajo da fotografia a preto e branco, à primeira vista parecia-me o Obama.

    Claro que um bom mapa, poupa muito palavreado, seja para chegar ao destino, seja para perceber o funcionamento da nova maquina fotográfica.
    Mas palavras e imagens não são intermutáveis.
    Palavras são indispensáveis para descrever conceitos abstractos de lógica, ética filosofia, condicionam contractos politicos e processos de trabalho.
    Imagens, esclarecem detalhes de forma e clarificam estruturas e relações de espaço.

    Procurar, seleccionar, editar e apresentar dados é complicado.
    Apresentar uma imagem perturbadora que possa manipular emoções pessoais na direção politica desejada, é fraudulento.
    Creio até, que este simplismo põe em causa de forma perigosa a própria democracia.
    Em Gaza, existe uma industria completa em matéria de desinformação audiovisual.

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  4. @ Go_dot: "A crença comum, que uma imagem vale mil palavras,"

    Go_dot,

    A crença realmente existe. As pessoas julgam que a imagem, ao contrário do texto, não pode ser fabricada e atribuem-lhe o estatuto de sagrado. Mas hoje em dia, com a utilização generalizada do programa Photoshop, a crença está a perder terreno e a imagem, se quer ainda realmente convencer, tem que mexer. Dando origem ao EL VIDEO, e por tabela à bela expressão “só acredito com imagens-a-mexer”.

    Mas os palestinos, como você indica no seu comentário, já estão a destruir a bela imagem do irrepreensível vídeo, com a fabricação industrial de combates e feridos simulados que vendem aos jornalistas do mundo inteiro que chegaram atrasados aos locais de combate…

    Mas as duas imagens inseridas neste post são anteriores ao Photoshop (e aos palestinos) e, não valendo as mil palavras do ditado, podem, penso eu, substituir facilmente uma porrada delas…

    Tanto a imagem do Papa como a do colonialista britânico são verdadeiras e não precisam de ser fabricadas nem alteradas para que toda a gente as entenda. Fazem parte de uma época e inserem-se perfeitamente na ideologia, na política e na forma ‘straightforward’, directa, sem complexos e sem censuras politicamente correctas da história dos povos europeus.

    A única discussão possível é sobre eventuais comentários às imagens!

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  5. Estou na duvida, se terei percebido bem a ideia deste post. Espero não estar totalmente “off topic”.
    Como disse no comentário anterior, a redacção de imagens, talvez até devido à actual facilidade, é um dos temas mais insidiosos com que a comunicação social está a ser confrontada. O tema pareceu-me apropriado.

    No meu entender, as duas imagens apesar de “verdadeiras” não falam.
    São símbolos mudos. Poderão substituir uma porrada de palavras, mas estão dependentes de quem (e quando) as decifram. Por isso são entendidas de maneiras diferentes.

    Sobre as imagens a mexer, o vídeo digital tornou-se nos últimos anos, uma espécie de Photoshop on steroids.
    Tudo é possível, tanto parado como a mexer.

    De resto, o uso e a manipulação de imagens fotográficas para fins políticos, é tão velho como a própria fotografia. O KGB já sabia tudo sobre o assunto, muito antes dos irmãos Knoll terem nascido.

    Dois clássicos.
    Antes http://imgur.com/WmFId
    Depois http://imgur.com/OQAWV

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  6. Go_dot disse: “No meu entender, as duas imagens apesar de “verdadeiras” não falam. São símbolos mudos. Poderão substituir uma porrada de palavras, mas estão dependentes de quem (e quando) as decifram. Por isso são entendidas de maneiras diferentes.”

    Go_dot,

    As imagens NÃO são entendidas de maneira diferente…

    M.Moura viu na imagem – segunda imagem a cores - precisamente o que ela representa: o colonialismo britânico (com toda a certeza na Ásia). Eu, mesmo sem a legenda que ele lhe atribuiu, chegaria imediatamente à mesma conclusão: colonialismo britânico. Não creio que haja muito gente que consiga ver outra coisa…

    Achar COLONIALISMO uma coisa boa ou má, ou então, apoiado na imagem, sugerir que os britânicos teriam o monopólio desta forma de transporte, é pura interpretação (da imagem) com base numa percepção ou visão ideológica do mundo. É a visão ou interpretação da imagem, e não a sua representação, o que deu origem a este post.

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  7. Caro José, apesar de fazer uma leitura dos detalhes da imagem, sensivelmente diferente da tua, estamos de acordo, que é uma imagem da historia do colonialismo.
    Como é costume das imagens fotográficas, são explicitas na forma. Não há duvidas sobre o chapéu os trajes a cadeirinha etc. Para alem disto estão dependentes da interpretação (ideológica) do observador.

    Tentei sublinhar, o que é o pão nosso de cada dia nas noticias. “... pura interpretação (da imagem) com base numa percepção ou visão ideológica do mundo.”

    Pareceu-me interessante ouvir outras opiniões sobre o motivo. Aparentemente o entusiasmo não é grande.

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  8. Go_dot disse: "....dependentes da interpretação (ideológica) do observador."

    Precisamente. É só essa parte que não estou de acordo com M. Moura, Os ingleses, sim senhora, tiveram a parte deles de colonialismo, assim como tantos outros, mas nunca esconderam os seus crimes - pelo contrário. Hoje em dia as atrocidades e o colonialismo continuam, mas como não se trata de brancos arranjam-se sempre desculpas culturais.

    Um amigo meu, que leu o artigo e os comentários, acha - disse-me ao telefone - que o colonialismo britânico foi pior do que o nosso porque nós misturámo-nos mais com a população local....

    Uma forma original de ver a coisa, e tenho muita pena que ele não tenha encontrado a motivação e o entusiamo necessário para comentar mais alguma coisa do que apenas um BIBA. Assim vou especular quanto baste: digamos que só éramos racistas em relação a ± 50% da população: aos homens. Não em relação às mulheres (a partir dos 15 anos de idade). Já não é nada mau.

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  9. Uma das razoes que no fim dos anos sessenta me levou a dar “o salto”, como se dizia na altura dos gajos que fugiam à tropa. Foi uma fotografia 6x6, a preto e branco, bastante amarrotada, que teria sido tirada, algures em Angola e que circulava no Porto, na zona entre o café Diu e o Peninsular.
    De memoria, mostrava dois indivíduos brancos em calções, um, com uma catana na boca, estilo pirata, segurava com as duas mãos a cabeça de um negro, o outro, simulava um pontapé à baliza numa bola que se percebia ser outra cabeça. A baliza eram duas estacas onde se encontravam espetadas mais duas cabeças. Recordo-me do horror com que vi as imagens e da decisão imediata, que aquele horror não faria parte da minha vida.

    40 anos mais tarde. Não sei se a fotografia terá tido origem nas câmaras-escuras do KGB, o que não me admirava, ou se faz realmente parte da historia do colonialismo português, o que também é provável.
    Comparando a imagem da minha memoria, com a imagem do “colonialista britânico”, compreenderás não só o meu cepticismo em relação valor estatístico das imagens, como a minha ineficaz tentativa de esmiuçar o papel das mesmas, na nossa percepção da realidade.

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  10. Go_dot e outros,

    Talvez fosse interessante, para um próximo post, que cada um imaginasse frases alternativas para descrever a fotografia do presumível colonialista britânico. Mas por favor, um pouco mais de humor…

    Dou o pontapé de saída:

    Turista torce um pé em longa caminhada e é gentilmente transportado por locais até ao seu bungalow.

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  11. Ta bem!
    Divertido e bem-humorado? com este tempo?...
    Forget it! Vou esperar até me sentir melhor.
    Boas festas para todos.
    Sobretudo sem chatices.

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