NÓS, DE ESQUERDA

Um formidável desabafo do escritor belga flamengo Herman Brusselmans. Uma espécie de 'shahada' (testemunho no Islão), não para se converter ao Islão, mas para finalmente entrar no clube da malta da corda...

Parece que os muçulmanos neste momento fazem todos os possíveis para a gente deixar de achar que eles são boas pessoas. Porque nós - adeptos do pensamento básico de esquerda - sempre tivemos um fraquinho pelos muçulmanos. Sendo de esquerda, somos obrigados a ter uma adoração pela sua cultura diferente, roupa diferente, opinião diferente, outra forma de lidar com as mulheres, diferente, língua diferente, diferente maneira de arranjar um carro de 100.000 euros aos 20 anos de idade, uma estratégia diferente para odiar o mundo ocidental e a sua comida.

Nós, de esquerda, adoramos comer em restaurantes marroquinos, turcos, tunisinos, argelinos, sírios. E somos naturalmente obrigados a dizer muito bem da comida, mesmo que haja uma grande probabilidade de ficarmos de caganeira durante três dias seguidos. Nós, de esquerda, achamos que os muçulmanos não são bem tratados no nosso país, que são discriminados, que têm poucos direitos e muitos deveres, que são considerados cidadãos de terceira categoria. Mas todos os problemas relacionados com muçulmanos no malvado Ocidente é nossa culpa.

Já que foram os cabrões dos nossos antepassados quem nos séculos 12 e 13 invadiram o Oriente, para dar mocadas na cabeça dos pobretanas que viviam nessas paragens. E para gáudio de nosso Senhor Jesus Cristo destruímos o harmonioso modo de vida oriental. E isso ainda hoje está atravessado na garganta dessas pessoas. Ok, a gente faz de conta que não vê que eles também andavam à mocada uns aos outros, que inventaram centenas de formas de torturar, que tratavam as suas mulheres e filhas como gado, que eram os piores carrascos de animais da história, que tinham orgulho nos seus ditadores, e quando olhavam para o Ocidente pensavam: algum dia tudo isso será nosso. Ok, nós fazemos vista grossa a tudo...

No entanto, o que nós, de esquerda, vemos claramente, é que a Bíblia é absolutamente um livro de merda e o Alcorão uma obra prima. O que não deixamos passar, é que nós, ocidentais, somos opressores e conquistadores e escravizamos os orientais, e fizemos deles escravos do trabalho mais sujo. Nós de esquerda confessamos: 'Quando precisamos deles, entraram no nosso país por côdea e meia, mas agora que a terceira geração se revolta, queremos que sejam postos na rua? Nem em cem anos!'

É evidente que nós, de esquerda, queremos o maior número possível de orientais dentro das nossas fronteiras, porque eles são tão giros, e fixes, e pacíficos, e inteligentes, e acolhedores, e de fácil tratamento. E se alguns deles cometem assaltos, ou roubam velhinhas na rua, ou vendem droga, ou insultam raparigas de mini-saia de putas, ou colocam demasiado gel no cabelo, tudo isso é culpa nossa, porque não lhes facilitamos uma boa educação escolar e obtêm más notas na escola por não conhecerem bem a nossa língua. E isso porque não lhes damos o apoio social necessário que os pais infelizmente não podem dar, porque são analfabetos e sempre ocupados a fritar 'baklava', para, de alguma forma, estarem entretidos com os filhos.

Nós, de esquerda, também achamos que só nós somos culpados do 11 de Setembro, dos atentados em Londres e Paris, e agora em Bruxelas. Já para não falar da Charlie Hebdo. Nós somos todos Charlie, tudo bem, mas a redacção da Charlie estava mesmo a pedi-las. E o atentado da semana passada em Bruxelas estávamos também provavelmente mesmo a pedi-las. Assim como tudo é culpa do Ocidente. Sim, todas as desgraças que nos caem em cima podem nas calmas dizer que a culpa é nossa. A todos aqueles que nós não nos cansamos de acarinhar, de mimar, de admirar, não será que temos também de lhes dar a oportunidade de darem cabo de nós?

Que diabo, isto é o direito destes pobres infelizes! Eles têm todo o direito de se fazerem explodir com sacolas ou malas cheias de dinamite e pregos e matar o maior número possível de terríveis ocidentais. Nós, de esquerda - por muito trágico que seja - temos que aceitar e compreender, porque, mais uma vez: a culpa é nossa. Nós, de esquerda, estamos a cavar a nossa própria sepultura, e alguns entre nós até conseguem fazer isso com um sorriso nos lábios...