Anos mais tarde, durante a eleição na RTP do Maior Português de Sempre, os nossos caminhos separaram-se: o meu pai votou no Álvaro Cunhal e eu na pessoa que me proporcionou os maiores momentos de alegria durante a minha infância – Eusébio da Silva Ferreira.
Dou agora a palavra a Merijn de Waal, enviado
especial para Portugal e Espanha do Jornal holandês NRC e que entrevistou
Eusébio uns dias antes do último campeonato da Europa, em 2012.
Marcamos um encontro no seu restaurante
preferido, não muito longe da sua estátua. Ele tem dificuldade em andar, teve que
fazer uma série de operações no joelho esquerdo. No princípio do ano foi
internado por ter a tensão alta, mas agora já bebe um uísque com soda para
acompanhar a sua bica. Logo que o tom da conversa se torna nostálgico os
olhos de Eusébio cintilam como os de uma criança. Nota-se que Eusébio gosta de falar, mas de
preferência não do presente. Dirige constantemente a conversa para o passado.
Para os anos áureos do Benfica e do seu Portugal.
Em 1960 o Benfica pagou em Lourenço Marques (hoje Maputo) 7500 dólares à mãe de Eusébio – na altura um montante exorbitante por um jovem
futebolista africano. O jornal [?] publicou uma fotografia da mãe com as notas espalhadas
na mesa da cozinha. Ela prometeu devolver o dinheiro ao Benfica se o rapaz não
correspondesse às expectativas.
Mas o rapaz correspondeu a todas as
expectativas. A Pantera Negra tem hoje uma estátua à
frente do Estádio da Luz, a única estátua em homenagem a uma pessoa de cor em
Portugal. [Onde existem mais estátuas de pessoas de cor por essa Europa fora?
CdR].
É melhor não lhe fazer perguntas sobre os
últimos desafios entre Portugal e a Holanda, e muito menos sobre o arraial de
pancadaria que ocorreu nos oitavos de final do Campeonato do Mundo em 2006, em
que Portugal ganhou à Holanda. Eusébio: “quando vejo algo que não me agrada,
prefiro esquecer.”
Sobre o Cristiano Ronaldo condescende em dizer
algo mais: “Ele telefona-me de vez em quando. Dou-lhe conselhos como jogador e
como homem. Mas ele já é adulto, já aprendeu muito. A única coisa que lhe digo
é que deve concentrar-se na sua maneira de jogar e esquecer o público.
Concentração no jogo. É só isso.”
Mas Eusébio fala de preferência sobre a sua
carreira, quando defrontava os grandes craques da altura, como Pelé, Di
Stéfano, George Best, Garrincha, Cruijff e Bobby Charlton. Como derrotou em
Amesterdão o grande Real Madrid em 1962 na final da taça da Europa por 5-3,
marcando ele próprio dois golos. Este desafio criou uma ligação para a vida com
Alfredo Di Stéfano, a grande vedeta do Real Madrid. “Um dos mais belos momentos
da minha vida, foi quando ele me convidou para a apresentação do Cristiano Ronaldo
no Real. Ouvir 70.000 pessoas a gritar o meu nome, isso não tem preço.”
Segundo ele a sua geração foi a melhor da
história do futebol. “Se a nossa geração tivesse acesso à tecnologia dos nossos
dias: material e assistência médica, o nosso jogo teria sido ainda melhor. Eu
só tinha dois pares de chuteiras. E os pitões por vezes atravessavam as solas,
fazendo sangrar os pés. Também a qualidade das bolas era pior. Com as bolas
actuais é possível rematar com mais precisão a grande distância. Eu teria
marcado muito melhor os livres directos.”
Eusébio é frequentemente comparado com outro
craque do passado, Pelé. Quem era o melhor? “Eu sou jogador e este tipo de
polémicas é o exclusivo de pessoas que apenas escrevem sobre futebol e que nunca
jogaram. Eu e Pelé tínhamos estilos diferentes. Além disso eu jogava na Europa
e na selecção portuguesa. O Pelé jogava na fortíssima selecção do Brasil, por
isso é que ele era campeão.”
“A primeira vez que nos defrontamos foi em 1961, no Torneio de Paris. Tinha eu 19 anos e o Pelé 20. O Santos ganhou
ao Benfica por 6-3. Só joguei 20 minutos, mas marquei os três golos do
Benfica. Ele jogou o tempo completo mas não marcou um. No final do jogo
trocamos de camisolas e eu, estúpido, tive a vaidade para lhe fazer o reparo.
‘Falam muito em ti, mas durante 90 minutos não foste capaz de meter um golo.’”
"Ele desatou a rir, achou piada. Não nos
conhecíamos, era o meu primeiro torneio internacional. O que é que eu sabia do
mundo? Até ao dia de hoje eu e o Pelé somos como irmãos. Telefonámo-nos quando
fazemos anos.”
Segundo Eusébio o futebol actual está
contaminado pelo comércio. “Os jogadores já não compreendem a dimensão
histórica e a mística da camisola que vestem. Por exemplo, agora, um jogador do
Benfica deixa o clube passado um ano ou dois. Abala sem ter a mínima noção da
história e da grandeza do clube.”
No entanto também Eusébio teve vontade de
abandonar o Benfica. Mas o ditador Oliveira Salazar travou os planos de uma
transferência para o estrangeiro, declarando Eusébio ‘Património Nacional’. Só depois da Revolução dos Cravos, em
1974, é que ele pode jogar fora de Portugal, mas a sua carreira já estava quase no fim.
"Na altura fiquei triste em não
poder jogar no estrangeiro. Poderia ter jogado no Real Madrid ou no Manchester
United. Mas bem vistas as coisas estou contente – fui muito bem tratado no
Benfica. Foi melhor assim.”
Eusébio! Sempre!
ResponderEliminarÉ claro que o Eusébio vai para o céu e, lá no céu, é possível formar uma excelente selecção com os jogadores portugueses que já morreram e ganhar (quase) SEMPRE o Campeonato do Paraíso Eterno.
EliminarAté não sei se o Eusébio teria lugar na equipe, ao lado dos cinco violinos do Sporting?
O Eusébio no eden e vc aqui a ser comido pelo Estado...mas isso nao lhe interessa...o Eusébio é que é a razão da sua existencia....com portugueses como vc estamos mesmo lixados...que são aos milhoes....
Eliminaró inclemência, ó martírio,
Eliminaragora a falta de humor também é anónima! Ó santinho, há AQUI um pequeno detalhe que lhe escapa, é que eu não estou AQUI, estou a 2200 km do seu AQUI. Por isso, a ser comido, só se for por uma holandesa boa...
"Na verdade, vários clubes tentaram adquirir o “Pantera Negra”, sendo emblemática uma proposta da Juventus, em 1964, que obrigou o governo de Salazar a mandá-lo para a tropa e a declará-lo tesouro nacional.
ResponderEliminarEssa decisão do governo português de o defender como património do país, acabou por impedir Eusébio de atingir um patamar ainda maior no seio do futebol internacional."
O camisa 13.
Nunca vi o King jogar, mas tenho arrepios ao ver o grande jogo de 66 contra a Coreia do Norte. Outro grande jogo que me deixou maluco foi contra a Inglaterra na Luz no Euro de 2004, o King a dar conselhos ao Ricardo grande jogo este.... Rui Costa entra e resolve parte do problema....
Quando eliminamos os suecos pensei ver o King no banco no Brasil com a sua famosa toalha branca, já não vai ser possível... Pena o Benfica não ter ganho aos Blues na Arena de Amesterdão.
Job done, King.
Não estou tão certo que a decisão de transformar Eusébio em Património Nacional, impedindo-o de jogar na estranja, o tenha "impedido de atingir um patamar ainda maior"!!!
EliminarTendo em conta a personalidade de Eusébio, talvez tenha sido melhor assim para a sua carreira de futebolista. Ele próprio parece admitir o facto na entrevista que deu a Merijn de Waal.
http://aoutravisao.wordpress.com/2010/12/24/lendas-nada-desconhecidas-eusebio/
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=agmUnnjM8eQ
ResponderEliminarhttp://www1.folha.uol.com.br/fsp/esporte/fk2506200403.htm
ResponderEliminarQuando cheguei à Holanda (1966) e dizia que era português, era normal ouvir os holandeses dizer: ah, Eusébio! Ele era, à época, certamente o português mais conhecido nesse país. Para o bem e para o mal, o futebol era (então) o único embaixador de Portugal. Ainda hoje o é, infelizmente. Mas, esse facto, não tira o mérito ao "rei".
ResponderEliminarPrecisamente. O futebol e o Eusébio é que eram os verdadeiros embaixadores de Portugal na noite de breu.
EliminarNunca vi o jogar, lamento. Para todo a gente e nos jornais agora eh o Rei.Que nao percebo eh porque os Portugueses que conheco na Holanda, quando ao longo dos anos discutiram quem foi o melhor jogador do todos os tempos nunca mencionaram Eusebio. Mencionam Maradonna e Pele, sim. Messi? talvez, vamos ver. Cruijff? So na Holanda (enveja, claro). Mas Eusebio? Ninguem.
ResponderEliminarHans
Para ser franco, só agora é que vejo constantemente a designação de "REI" para Eusébio!!! No meu tempo REI era apenas o Pelé, o Eusébio era a PANTERA NEGRA….
EliminarMas se os portugueses ao longo dos anos NUNCA mencionaram Eusébio como o melhor jogador do mundo, isso significa que os meus compatriotas são pessoas sensatas - estou agradavelmente surpreendido! -, que, ao contrário de grande parte dos teus compatriotas, acham Pelé, Maradona e Messi um bocadinho melhores que o resto – incluindo o Cruijff claro….
Nao seria que os teus compatriotas abracam os seus herois so depois de morrer? E Messi claramente nao tem o nivel do Pele ou Maradona. So na equipa de Barcelona (com iniesta en Xavi etc - digamos a equipa nacional de Espanha - o melhor equipa dos anos passados - estreia e brilha. No nacional nao mostrou nada. Christiano Ronaldo eh o melhor jogador de hoje em dia). Agora Cruijjf: levou todos as equipas em que jogou num outro nivel. Era o jogador que inventou o Barcelona de hoje, que inventou o totaalvoetbal, e ao mesmo tempo era ballerina (e beleza dos seus movimentos, ai...), goalgetter e numero 10. Ganhou muitos europacups 1 en so nao ficou campiao do mundo com Holanda em 1974 por arrogancia e obstrucao de parte das alemaes. Eh philosophe tambem. Pele era so goalgetter, Maradonna sim era goalgetter e numero 10 e melhorou as equipas em que jogou, mas nao inventou nada, falta tambem a philosophia. I rest my case...
Eliminar“Os jogadores já não compreendem a dimensão histórica e a mística da camisola que vestem.”
ResponderEliminarJá o mesmo, não pode ser dito dos adeptos ou do país. Se a consciência histórica do futebol, (futebolística?) contribuísse para a prosperidade do país, seriamos com certeza dos mais ricos do mundo.
Precisamente. Muito bem visto.
EliminarE como sei que você não percebe nada de bola, ainda lhe vou arranjar um argumento suplementar:
tendo em conta a relativa pequena quantidade de jogadores profissionais em Portugal (idem amadores, quando comparados com outros países europeus), os portugueses provam que são super-dotados para a Santa Bolinha. Basta ver a quantidade de grandes craques que Portugal até hoje produziu. Se em vez de futebolistas tivessem sido prémios Nobel em coisas que se vendam, a gente estava agora ao nível da Suíça………..e sem Euro, e sem Troika…..
a gente estava agora ao nível da Suíça… e sem Euro, e sem Troika…..
EliminarEra aí que eu queria chegar.
Perceber? percebo que a bola é redonda e o jogo ligeiramente mais emocionante que bilhar às três tabelas.
"Mais emocionante que bilhar às três tabelas"
ResponderEliminarPudera, a quantidade de tabelas é incalculável...